Tô sentada numa mesa de bar e um cara ouve Disritmia sem parar. Tô com vontade de mijar. Penso no homem que mais amei na vida. Meu copo tá cheio, bebo sei lá por quê. Hoje vi que tenho saturno em aquário e tô fodida, foi o que pensei de imediato. Um menino veio me vender amendoim, ri com ele, dei parabéns porque foi seu aniversário recentemente. Cheguei aqui no bar e pensei que gosto da vida que eu tenho. Fiz o que sei, amo os meus e detesto poucos. Gosto da rua, de amores de calçada e de relembrar o passado. Mas hoje me dei conta de que relembrar o que passou é um hábito, não um prazer. Sei lá, todo mundo sofre. O cara ainda tá ouvindo Disritmia. É claro que ele queria estar com alguém. Eu sigo bebendo. Não sei com quem eu queria estar. Quem eu amei não dá. Hoje em dia não amo mais, sem covardia, sem lamento, sem verdade. A vida é um samba de Aldir Blanc cantado numa tarde vazia, com o copo cheio. Sou do subúrbio, vibro com alguém cantando os exus catimbeiros, com a cerveja gelada e o dinheiro na conta. Já fui capaz de fazer loucura por alguém. Já fiz. Já me envergonhei. Já dormi e acordei achando que a vida é boa pra caralho. Já dormi e acordei achando que a vida não valia a pena. Vi que valia. Me encontro nas calçadas, nas vielas, nos becos, na ralé. Tenho preguiça dos que se sentem. Não sei lidar com elogio. Sou o Tempo, sou Oxum, sou Ogum me amparando. Há uma correnteza que me leva serena e outra que me arrasta. Sou o samba de Paulinho da Viola na madrugada de choro escondido, sou a letra de Nei Lopes num sábado de manhã, sou a voz de quem ama num peito batendo quando se acorda. Sou amor e ninguém vê. Que se fodam os que não enxergam. Sou beijo que se entrega e corpo que se dá no meio da noite. Quem tá comigo não dorme, mas acorda sorrindo. Há um riso que me embala. Sou o rio que corre, intenso e devagar. Eu preciso de um tempo grande num mundo onde toda gente é desconfiança. Quem chega até mim vê a cachoeira e o carinho. Disritmia. De vez em quando eu tenho. De vez em quando eu curo.
quinta-feira, 12 de setembro de 2019
sexta-feira, 21 de junho de 2019
180 anos de Machado
Não lembro a primeira vez que li Machado de Assis. Acho, porém, que foi com Missa do Galo, no Colégio Pedro II. As experiências iniciais não foram as melhores, embora eu olhasse pros seus livros com alguma simpatia. E pouquíssima disposição, confesso. Só que mais pro fim do Ensino Médio eu decidi ler Machado com maior disposição, aproveitando o embalo de ter acompanhado a minissérie "Capitu", que me aproximou mais de Dom Casmurro.
Quando entrei na Letras, na UFRJ, eu já sabia que me dedicaria a estudar Machado. Ao longo de todo tempo que fiquei na faculdade, fiz três cursos sobre o autor: um como ouvinte no início da graduação, depois sem ser apenas ouvinte e outro no mestrado, todos ministrados pelo professor Ronaldes de Melo e Souza. Minha monografia foi sobre teorias na crônica machadiana; minha dissertação, sobre a escrita literária também na crônica machadiana. Percebi que Ressurreição era meu livro preferido dele, depois me apaixonei por Esaú e Jacó e hoje em dia não sei qual acho melhor.
Há dois anos terminei o mestrado. No final de 2016, fui premiada na Academia Carioca de Letras pelo melhor ensaio sobre a obra de Machado. No ano passado, fui convidada para falar, também na Academia Carioca de Letras, sobre a minha dissertação. Aprendi muito com o aniversariante de hoje, sigo aprendendo e sei que posso aprender muito mais. Minha relação com a literatura, sobretudo a brasileira, é como a que tenho com o samba e o carnaval: não vivo sem. E Machado tem uma participação fundamental nisso - na minha formação, na minha visão de mundo, no meu modo de encarar os contrários que se harmonizam no ser humano.
Obrigada, Bruxo. Agora, cento e oitenta anos depois, você enfim tem este retrato que te representa fielmente: negro, carioca, brasileiro, o escritor mais incrível deste país.
sexta-feira, 31 de maio de 2019
África: o baobá da vida Ilê Ifé
Dentre os muitos sambas bons que tem a Beija-Flor, um dos meus preferidos é o que conduziu a escola no desfile campeão de 2007 - composição de Claudio Russo, J. Veloso, Gilson Dr. e Carlinhos do Detran -, do qual destaco um belíssimo trecho: "Agoyê, o mundo deve o perdão/ A quem sangrou pela história/ Áfricas de lutas e de glórias".
Por ser de lutas e glórias, em 25 de maio a África é celebrada. O dia foi escolhido devido à criação da Organização da Unidade Africana (OUA) na Etiópia, na data de 25 de maio de 1963, a fim de defender e emancipar o continente. Nove anos depois, foi decidido pela ONU que esse passaria a ser o dia da África. E o trecho do samba da escola nilopolitana assim se confirma, já que a celebração é uma forma de resgatar a memória dessa luta pela independência a partir do combate à colonização europeia e ao Apartheid.
Sábado passado, portanto 25 de maio de 2019, um evento comemorando o aniversário de Madureira acabou se tornando, para mim e para todos os que se reuniram na Arena Carioca Fernando Torres, no Parque Madureira, também a comemoração do Dia da África. Uma roda de samba que tem Nei Lopes e Zé Luiz do Império como convidados, além de ser coisa fina, sinhá, une a resistência do samba - desde sempre atacado pelos mesmos que naturalizam a absurda depredação de terreiros - e a identidade negra que os dois representam. Cantando "Morrendo de saudade", "E eu não fui convidado", "Malandros maneiros" e "Senhora liberdade", pareciam ter transformado a roda numa aula em que a didática se revelou no batuque, na criança que bateu palma, nas vozes que cantaram como se expulsassem as agonias que muitas vezes pesam a vida.
E os termos "aula" e "didática" me levam a um educador profundamente comprometido com uma Educação emancipatória, inclusiva e libertária, sendo por isso mesmo odiado por aqueles que se interessam apenas pela manutenção da desigualdade, que não emancipa, não inclui e não liberta. Paulo Freire, no livro Cartas a Guiné-Bissau: registro de uma experiência em processo, fala da sua relação com a África: "Meu primeiro contato com a África não se deu, porém, com a Guiné-Bissau, mas com a Tanzânia, com a qual me sinto, por vários motivos, estreitamente ligado. Faço esta referência para sublinhar quão importante foi, para mim, pisar pela primeira vez o chão africano e sentir-me nele como quem voltava e não como quem chegava".
Ainda comentando essa relação, ele detalha a admiração por uma "cultura que os colonizadores não conseguiram matar, por mais que se esforçassem para fazê-lo". A resistência, a luta movida pela indignação e pela ancestralidade, o drible na morte fazem com que a África seja o baobá de um Brasil avesso ao de hoje. No Dia da África, e em tantos outros, é preciso lembrar as negras e os negros que nos ensinaram e nos ensinam a lutar por liberdade.
domingo, 19 de maio de 2019
Vai chamar quem mora longe
Na semana passada, falei rapidamente com um professor de música sobre o jongo, enquanto corria o intervalo na sala dos professores. Mencionamos a Serrinha e isso me lembrou de imediato o dia em que cheguei cedo à Feira das Yabás e parei em frente à roda de jongo que acontecia naquele instante.
Um menino, embalado pelo que via e ouvia, mexia o corpo miúdo, mostrando toda a desenvoltura dos pequenos que mal aprenderam a andar. Senhores e senhoras se cumprimentavam e dançavam revelando uma energia própria dos que jongam - como se a Feira das Yabás não tivesse ameaçada por uma prefeitura disposta a eliminar qualquer manifestação cultural de matriz africana; como se essa cultura, fortalecida por seus ancestrais, jamais pudesse ser eliminada por qualquer projeto fundamentado no preconceito. E quem via a roda de jongo sabia: ninguém apagaria mesmo o riso encantador, e por isso subversivo, daqueles que encaram a vida batendo palma, cantando e mexendo os corpos ao toque dos tambores.
Foi assim que Tia Maria viveu. Foi assim, pertinho do tambor, que ela se foi, numa despedida de pisar devagarinho no chão da Serrinha antes de seguir para o Orum. Ao longo dos 98 anos, atravessou a Sapucaí com o verde e branco imperiano e viu a escola que fundou voltar ao grupo especial com o campeonato de 2017, sabendo que seu quintal é maior que o mundo e que a poesia mora lá, em Madureira. Na Feira das Yabás, onde fui algumas vezes depois do dia em que vi o jongo, Tia Maria subiu no palco para mostrar o que confirmou recentemente ao jornal O Globo, em sua última entrevista: "Nasci com o jongo e vou com ele até o final, só paro de dançar quando Deus quiser".
E foi ontem que Tia Maria parou de dançar, talvez porque soubesse, na calmaria daquele sorriso que convidava tudo quanto é gente para conhecer o jongo, que no Ayê continuarão dançando e entoando um canto fundamental: "Vai chamar quem mora longe, tambor". Machado!
quarta-feira, 10 de abril de 2019
Heroínas negras brasileiras
Depois do Carnaval e da histórica vitória da Mangueira, com um enredo necessário sobre a história brasileira não contada pela versão oficial, aproveitei para mais uma vez ouvir as Marias, Mahins, Marielles, malês, agora por meio dos cordéis de Jarid Arraes, no seu Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis. Na orelha do livro, a escritora comenta que em toda a vida escolar não ouviu falar em mulheres negras que combateram a escravidão, e foi assim que, já adulta, decidiu pesquisar nomes avulsos na tentativa de resgatar suas origens afro-brasileiras. Devido a isso, surgiu a coleção de cordéis intitulada “Heroínas Negras na História do Brasil”, material explorado nas salas de aula e que originou o livro com 15 desses cordéis reunidos.
Recentemente, o já citado desfile da Mangueira se tornou memorável por subverter a lógica social lembrada no prefácio da obra: “os nossos heróis e heroínas, quando negros, têm sido odiosamente relegados ao esquecimento”. Com base nessa perspectiva e no fato de que as mulheres, sobretudo negras, sempre enfrentaram o silenciamento provocado pelo machismo que segue desrespeitando suas vozes, os 15 cordéis também subvertem o padrão imposto por homens brancos. Além disso e por esse motivo, são uma forma bonita e necessária de mostrar a face democrática e encantadora do país. Mencionando o samba da Estação Primeira, “Brasil, o teu nome é Dandara” — mas é também Antonieta de Barros, Aqualtune, Carolina Maria de Jesus, Esperança Garcia, Eva Maria do Bonsucesso, Laudelina de Campos, Luísa Mahin, Maria Felipa, Maria Firmina dos Reis, Mariana Crioula, Na Agontimé, Tereza de Benguela, Tia Ciata, Zacimba Gaba e tantas outras mulheres de luta.
Como sou professora, é ainda mais gratificante ver que o livro começa com a história de Antonieta de Barros: “Por inteira a sua vida/ Viveu como educadora/ Jornalista ou deputada/ Se manteve ensinadora/ Com lições educativas/ E também libertadoras”. Por ter lutado contra o racismo e o machismo, ela nomeia a Medalha que é anualmente concedida pela Assembleia Legislativa de Santa Catarina a mulheres que combatem a desigualdade de gênero. Em seguida, a nordestina Jarid Arraes homenageia Aqualtune — princesa, guerreira, líder africana que lutou contra a invasão de seu reino no Congo e avó de Zumbi –, aproveitando para lembrar suas próprias raízes: “A história do meu povo/ Nordestino negro forte/ É tão rica e importante/ É vitória sobre a morte/ Pois ainda do passado/ Modificam nossa sorte”.
A escritora Carolina Maria de Jesus tem no cordel sua vida de catadora de papel relatada, função que cumpria para sustentar a família. Marginalizada, sofreu com a ignorância do racismo e com as dificuldades na favela do Canindé. Anotava tudo o que acontecia, no entanto, e as anotações originaram Quarto de despejos, livro traduzido para várias línguas e vendido para mais de 40 países. Portanto, é “Carolina eternamente/ Uma imensa inspiração/ Uma força grandiosa/ E também validação/ A mulher negra escritora/ Que despeja o coração”. Outra força grandiosa é Dandara dos Palmares, guerreira do Quilombo e mulher de Zumbi. Revolucionária, Dandara representa o Brasil feito da incansável luta impulsionada por mulheres que driblam as limitações que lhe são impostas. Ao se suicidar para não retornar à condição de escrava, revela toda coragem e liberdade que seu nome carrega: “Até mesmo a sua morte/ De heroísmo foi repleta/ E a mensagem que anuncia/ Entendemos bem completa:/ Rejeitar a rendição/ É a nossa condição/ Como um grito de alerta”.
Tendo no nome uma definição própria, Esperança Garcia dá seu grito de alerta ao escrever uma carta de denúncia de maus tratos aos escravos endereçada ao presidente da Província de São José do Piauí. Sendo escrava, foi alfabetizada por padres jesuítas e, assim, fortaleceu sua voz a partir da escrita. Mesmo que não se saiba se teve êxito no que solicitou na carta, é certo que combateu a exclusão: “Porque no Brasil passado/ O escravo era excluído/ Sem saber ler e escrever/ Sem poder ser instruído/ Caso alguém fosse enfrentar/ Acabava perseguido”. Outra história de coragem é contada em seguida, e diz respeito à quitandeira — escrava alforriada — que enfrentou um homem branco, dono de uma cabra que levou alguns dos seus alimentos estendidos em uma calçada de Bonsucesso para venda. Eva Maria do Bonsucesso foi atrás do animal e José Inácio de Souza, dono da cabra, bateu na quitandeira, que revidou, foi parar na polícia e venceu o caso devido às testemunhas que a defenderam. O desfecho, justo num país injusto, torna o episódio emblemático: “Como fosse muito pouco/ Eva não ter sido presa/ O desfecho foi maior/ Do que só sair ilesa/ Foi o branco enclausurado/ Por bater foi condenado/ Na mais dura da certeza”.
Essas e outras histórias de heroínas negras brasileiras abordadas no livro mostram poeticamente para nós, leitores, que a luta das mulheres não é recente. E ao dedicar a obra “às heroínas do presente, por acreditarem num futuro possível”, Jarid Arraes confirma ser essa luta, além de antiga, constante. Por esse motivo, os cordéis precisam mesmo ser espalhados pelas escolas de todo o país, discutidos em sala de aula e em qualquer espaço de reflexão. Somente dessa forma é possível que a gente construa um país que não tá no retrato, parafraseando novamente o samba da Mangueira — que menciona mais duas mulheres negras presentes no livro: a líder da batalha pela independência da Bahia, Maria Felipa; e a importante guerreira africana da Revolta dos Malês, Luísa Mahin.
Publicado originalmente no Além de Machado.
domingo, 17 de março de 2019
Um poema pra Mangueira
De verde e rosa me pintei e me vesti
Na Sapucaí defendi sua bandeira
De brava gente feito Beth e Leci
Nesse carnaval eu vi Dandara
Guerreira negra destemida
E chorei ao cantar na quadra
O samba da Manu da Cuíca
Entre serpentinas e confetes,
ouvi a voz das Marielles
Baiana, rainha, porta-bandeira
É das mulheres a Estação Primeira
Ali outro Brasil foi emoldurado:
na chuva sambava o menino
e um grito jamais silenciado
revelou ao país um novo hino
De duas cores se vestiu a quarta-feira
Vibrei com as notas da apuração
E sei que corro o risco de meu coração
Em outro carnaval bater pela Mangueira
sexta-feira, 1 de março de 2019
Para a minha cidade
Rio,
Eu te conheci saindo de uma maternidade de Marechal, subindo uma rua em Piedade, vendo confetes espalhados numa calçada da Abolição, reparando senhores jogando buraco na praça de Cascadura, espiando imagens, bichos e roupas no Mercadão de Madureira.
Fui te descobrindo, Rio, quando pisei em São Cristóvão, quando parei num balcão tijucano, quando me apaixonei na Lapa, quando subi a rampa do rubro-negro Maracanã, quando chorei uma dor calada no Sambódromo, quando andei da Rua do Rosário à do Ouvidor, quando cantei debaixo do viaduto da Mangueira, quando vi a madrugada ir embora num bar em Botafogo.
E eu te amei todas essas vezes, Rio, além daquelas em que vibrei pelas calçadas musicais de Vila Isabel, senti saudade pelas bandas do Andaraí, vi a feira terminando na Glória, desci o Morro do Pinto acompanhando um bloco, passei a noite na Gamboa e caminhei de uma a outra ponta do Méier.
Andei pelo Cachambi, pelas areias de Copacabana, parei na porta do Cacique, vi capoeira na Lavradio e entendi que pode ser que uma hora ou outra o amor acabe no mesmo lugar onde começou, e que eu, irrelevante diante da imensidão da cidade, sou alguém que vai por aí, com um retrato no bolso, uma saudade esquecida, um olhar de viés que tudo observa e a disposição para continuar caminhando pelas mesmas ruas cariocas que um dia me feriram ou me fizeram profundamente feliz.
Excesso de beleza me comove tanto que por vezes me causa dor. Essa cidade é minha vida inteira, corrida no rio fundo, manso e traiçoeiro que é se entregar ao que se ama. Minha cara ainda é o Rio de Janeiro.
segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019
Para os homens que amei
Vieram cheios de passado
os homens que amei.
Sem que isto importasse,
talvez fosse eu a culpada
por me negar a quem chegava
sem histórias, papel em branco.
Vão agora sem que haja pranto,
depois de muito reencontro,
pouco que seja, vão andando
sem aceno, mágoa ou raiva;
quando quiserem, olhem
para trás (eu, outra, sempre
estou no mesmo lugar).
Se me ausento, é para não remoer
nem querer esquecer ou lamentar
o que por vezes retorna, imerecido;
se sorrio, e eu sempre sorrio,
é porque sei que fomos impulso
e que há lugares invisíveis onde
ficam guardados os meus Rios:
as ruas pelas quais passamos,
de mãos dadas, num abraço
partido, em silêncios avulsos
ou algumas lágrimas caídas
sob pandeiro na mesma roda
em que olho e bebo e laço.
Se foram cheios de futuro
os homens que amei.
Sem que lhes contasse,
mais futuro tinha eu:
com um grande amor
que parecia deles mas
no fundo era todo meu.
terça-feira, 29 de janeiro de 2019
Ensino público, gratuito e de qualidade
Estudei em instituição pública federal de 2004 a 2017. Passei para o Pedro II muito mais porque meus pais mesmo com dificuldade me proporcionaram tudo o que eu precisava e muito menos por mérito próprio. Ter uma estrutura familiar, claro, foi parte significativa do processo (lembrando que essa estrutura significa afeto, e não modelo tradicional de família). Entrei enfim no Pedro II, de onde saí em 2010, após completar o Ensino Médio.
O colégio que vira e mexe é atacado por ignorantes que dizem ser ali um antro de esquerdistas me deu a base para eu ter uma visão igualitária, humana e democrática do mundo. Depois entrei na UFRJ pelo ENEM, por meio de ação afirmativa que o colégio público possibilitava. Lá fiz a graduação (2014) e o mestrado (2017) em Letras, tendo me especializado em Literatura Brasileira. No dia da minha formatura, meus pais, que não tiveram a mesma oportunidade e vibravam de felicidade por eu ter tido, eram só choro. E eu, olhando para eles, também.
Em todos esses anos de colégio e faculdade tive um ensino público de excelência, de comprometimento e qualidade. Durante esse tempo vi que o estudo e a pesquisa são para todos, e que os que são previamente julgados como incapazes são competentes demais, para o pavor de uma sociedade racista e classista. Tenho um compromisso sério com a Educação até o fim da vida, não só por ser professora, mas por acreditar no ensino público, gratuito e de qualidade. E por acreditar, sobretudo, que esse é o único caminho para avançarmos positivamente.
A sala de aula é espaço de troca, diálogo e alteridade. A Educação, ao contrário do que dizem por aí, não deve ser privilégio de uma elite brasileira. Se quiserem que seja dessa forma, continuaremos lutando, enfrentando e educando. Sempre.
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