Rio,
Eu te conheci saindo de uma maternidade de Marechal, subindo uma rua em Piedade, vendo confetes espalhados numa calçada da Abolição, reparando senhores jogando buraco na praça de Cascadura, espiando imagens, bichos e roupas no Mercadão de Madureira.
Fui te descobrindo, Rio, quando pisei em São Cristóvão, quando parei num balcão tijucano, quando me apaixonei na Lapa, quando subi a rampa do rubro-negro Maracanã, quando chorei uma dor calada no Sambódromo, quando andei da Rua do Rosário à do Ouvidor, quando cantei debaixo do viaduto da Mangueira, quando vi a madrugada ir embora num bar em Botafogo.
E eu te amei todas essas vezes, Rio, além daquelas em que vibrei pelas calçadas musicais de Vila Isabel, senti saudade pelas bandas do Andaraí, vi a feira terminando na Glória, desci o Morro do Pinto acompanhando um bloco, passei a noite na Gamboa e caminhei de uma a outra ponta do Méier.
Andei pelo Cachambi, pelas areias de Copacabana, parei na porta do Cacique, vi capoeira na Lavradio e entendi que pode ser que uma hora ou outra o amor acabe no mesmo lugar onde começou, e que eu, irrelevante diante da imensidão da cidade, sou alguém que vai por aí, com um retrato no bolso, uma saudade esquecida, um olhar de viés que tudo observa e a disposição para continuar caminhando pelas mesmas ruas cariocas que um dia me feriram ou me fizeram profundamente feliz.
Excesso de beleza me comove tanto que por vezes me causa dor. Essa cidade é minha vida inteira, corrida no rio fundo, manso e traiçoeiro que é se entregar ao que se ama. Minha cara ainda é o Rio de Janeiro.

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