Tive superpoderes na Gávea, cantei de olhos fechados no Largo de São Francisco, ganhei a viagem indo à Lapa, li destinos na Praça XV, andei pela Tijuca, conheci marchinha nova no Andaraí. Tem gente que reveste a cidade de São Sebastião com micareta e eu fujo disso porque dói quando eu Rio. Vitória da ilusão. Armei outro Rio de Janeiro pra recriar a criação.
No meu bloco não há corda; na minha escola ninguém pega fogo. O meu Carnaval é da rua e da bagunça, da cerveja e da gargalhada, do deboche e da emoção; é da comoção com a fantasia infantil, da saudade do tempo não vivido, do asfalto sujo de confete, do samba, da marchinha, da música brasileira, da senhora que dá a mão pra brincar no Carioca da Gema. E é também da melancolia, da dor que pinta e borda a máscara negra. Bandeira branca, amor.
Minha manhã de Carnaval nasce com a voz de Elizeth Cardoso. O sol desponta e a gente logo lamenta por Aurora não ser sincera. Nas noites das escolas de samba, ninguém dorme, e o lamento, dessa vez, é pelo monopólio da televisão, porque a concepção de Carnaval como cultura não existe onde deveria. Veio o esquenta da bateria e o aviso de que a hora havia chegado. A Vila Isabel desfilou bem e sorriu de novo.
Ficou fantasiada de Dolores Duran a noite de terça-feira. Fim de caso. Senti falta de tocar tamborim, de batucar o pandeiro, da companhia de um outro sábado de folia. Mas Paulo César Pinheiro e Wilson das Neves já disseram que não vim pra ficar. Esperei com sossego a quarta-feira de cinzas, dia de apuração e apuros. A pulsação acelerada indica que o folião apaixonado, num misto de esperança e memória, acaba transformando a vitória da ilusão em ilusão da vitória.
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