Desde que sentamos juntos no banco de trás, naquele domingo, passou a faltar matéria para a poesia porque ela, a minha, mesmo ruim, ficou monotemática, assim como os dias que vieram então outros, iguais, arrastados pela urgência de entrar de novo naquela rua e descer do carro pisando na calçada com o calafrio dos amores estridentes, iniciais, tresloucados, do avesso, o reverso do que sou. O perigo existe quando encontramos alguém que seja incompreensivelmente capaz de descortinar nosso inverso, aquilo exatamente que somos sem que os outros saibam. É quando o perigo flerta com o sublime, incandescente. Você me deu um beijo, ficou pelo caminho devido aos afazeres do dia e eu pedi que o motorista seguisse, ainda que a vontade fosse a de continuar sentindo sua mão apoiada na minha perna. Pode seguir, por favor. E a vida foi em frente, sem retorno, mostrando as saudades correndo vagarosas pela janela do banco de trás, feito paisagem bonita que vai embora enquanto a viagem progride, sem passagem de volta.

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