Rodavam as saias das meninas e dos meninos. Purpurinas enfeitavam o rosto, estrelas coloridas formavam constelações até então desconhecidas. Serpentinas espalhadas pelo chão e penduradas nos fios presos aos postes eram a fantasia das ruas. Continuavam a rodar as saias, um movimento que levava ao sorriso de quem acompanhava. Alguns batiam palmas, outros nem se mexiam, extasiados. As saias de meninos e meninas rodavam a roda viva de Chico, roda mundo, roda pião. Queriam voz ativa em cada saia rodada.
Dançavam tentando esquecer que pra alguns menino de saia não pode, e saia curta em menina também não. Dançavam para espantar as negativas sem sentido que tantos sopram ou gritam como se só a ordem importasse. Desordenavam a dança numa organização dionisíaca. Olhavam-se uns aos outros com muito riso, muita alegria. Crianças pediam aos pais para tocar o tambor que fazia as saias se movimentarem e rodarem a roda viva do mundo que cresce. Palhaços de rosto branco usavam a menor máscara, o nariz vermelho que não esconde nada, e surpreendiam foliões também em ritmo de tambores e vozes roucas de todo o carnaval. Todos tinham, ali, o nariz vermelho.
Em algum canto havia gente apanhando de cassetete da polícia, rodavam as saias meninos e meninas, cerveja sem patrocínio não podia, que não dava lucro pra quem já tem bastante. Uma polícia que mata tomava conta do carnaval, trazia lema e divisa e não queria deixar a gente botar o bloco na rua. A alegria incomoda. Foi assim também na festa da Penha, há tempos, quando proibiram a diversão traduzida em manifestação cultural. Mas suportaram a ausência de instrumentos na palma da mão, na caixinha de fósforo, no batuque na panela. Madame não gosta que ninguém sambe e é preciso sim discutir com madame. O lalaiá sempre resiste.
Cantando um samba, desceu a ladeira de Santa Teresa e, aos pés da Lapa, o Pierrô encontrou a Colombina. Beijos de carnaval às vezes poucos, às vezes muitos. É o céu na terra que supera a violência alheia e desfila novamente. As saias rodam, dançam coco, meninos e meninas suam e sorriem, rodam a beirada da saia, saltam, sobem, cisco no olho de quem chora. Há muita beleza na lágrima dos que choram, imersos naquela alegria. Espumas caem do alto, a cidade apaga a neblina e pinta em si um novo quadro de cores pra todo lado, formas difusas e confusas, desenhos difíceis de serem lidos. A existência humana, assim como esses desenhos, também não é fácil de ser entendida. Rodavam as saias das meninas e dos meninos. Todos tinham, ali, um nariz vermelho.
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