domingo, 29 de janeiro de 2012

A pena no chão


Depois de assistir a O Artista, filme que, provavelmente e merecidamente, será premiado no Oscar de 2012, não pude deixar de registrar minha cena favorita. Dos nove indicados – com exceção de Tão Forte e Tão Perto, que eu ainda não vi -, meu preferido é Os Descendentes, e acho, inclusive, que George Clooney merece muito o prêmio de melhor ator. No entanto, acredito que a Academia entregará a O Artista a estatueta de melhor filme.

Pois bem. Diante da metalinguagem presente na trama, vemos um astro do cinema mudo de sua época tentar combater a imposição da grande novidade do filme falado, que ganha o público com o avanço da indústria cinematográfica. Assim, George Valentim (Jean Dujardin) torna-se, além de ator, diretor e produtor de seus próprios filmes, a fim de um possível reconhecimento de que o modelo tradicional ainda possui seu valioso espaço. Contudo, mesmo com todo o esforço, passa a conviver com o fracasso de algo considerado obsoleto, enquanto Peppy Miller (Bérénice Bejo), artista que obteve seu auxílio ao iniciar a carreira, transforma-se na enorme atriz do cinema falado. O sucesso de George, então, só é recuperado de vez com a ajuda dela.

Feita essa breve contextualização, destaco aqui a cena que mais me chamou a atenção. Houve outras que achei fantásticas, como a conversação do personagem com sua própria sombra, mas registro o momento que gira em torno do genial jogo entre som x silêncio, representado pela inquietude de George em um sonho: ele, completamente avesso à ascensão do cinema falado, percebe os ruídos emitidos pelos objetos ao serem tocados, o que ocorre no mesmo instante em que sua voz se silencia. A cena dá-se pelo seu espanto ao ouvir o barulho de um copo posto sobre um móvel, continua com a sua perturbação exposta ao jogar outros objetos para certificar-se do som, juntamente com o cachorro latindo, o telefone tocando e mulheres gargalhando, e termina com o tom explosivo de uma pena caindo no chão. É como se o externo ganhasse voz e vez enquanto seu interior, por outro lado, perdesse o valor.

Nessa mesma perspectiva sobre interior e exterior, a vontade manifestada pelo personagem de querer manter o sucesso do cinema mudo transcende a própria história e passa a ser vista autêntica e veridicamente. Ou seja, embora o protagonista de O Artista tenha de lidar com o êxito atribuído à inovação dos filmes por meio da fala, o que se tem, agora, é a indicação de um filme mudo e em preto e branco ao Oscar, depois de já ter recebido o Globo de Ouro. Valentin ficaria orgulhoso se pudesse sair da história de Michel Hazanavicius e ver o sucesso que o cinema mudo tem feito no mundo real.